sábado, 16 de junho de 2012

Perdido na praia de Ipanema

Final dos anos 60, férias de verão e praias cheias em Ipanema. Não era como hoje, com a invasão de tribos das mais diversas, mas a galera comparecia em massa.

Nessa manhã ensolarada, minha prima de Belo Horizonte com seus vinte e poucos anos curtia o verão carioca na praia, e como era uma moça carinhosa e prestativa se ofereceu para levar com ela os dois primos pentelhos, eu e meu irmão, então com sete e seis anos respectivamente.

Nós adorávamos, é claro! A jovem prima era responsável, mas nos deixava à vontade para brincar na água e na areia. Ao contrário da minha avó, que se entrássemos no mar com água acima dos joelhos já nos gritava para voltarmos para a parte "rasa".

Apesar de estar sempre de olho em nós, existe aquela fração de segundo em que o cérebro desvia a atenção, e aí coisas impensáveis acontecem.

Meu irmão e eu estávamos na beira da água conversando, e ele disse que queria andar até as pedras do Arpoador para ver o que tinha lá. Eu, na minha curiosidade infantil incentivei-o a fazer isso, e fiquei a observar enquanto ele se afastava todo animado, talvez achando que eu o estivesse seguindo. Até que sumiu de vista.

Algum tempo depois minha prima já nervosa veio me perguntar aonde ele estava. Eu não sabia. E começou o corre-corre à procura do menino perdido.

Eu achava tudo muito interessante e emocionante. O comportamento dos adultos correndo de um lado para o outro, perguntando para todo mundo. Parecia cena de filme onde eu era espectadora e queria ver o desfecho.

Resumindo a história: Meu irmão ao se ver perdido abriu o berreiro. Foi socorrido por uma senhora que tinha um filho da mesma idade e perguntou aonde ele morava. Ele apontou o prédio e a senhora se prontificou a leva-lo em casa. Para faze-lo parar de chorar o sorveteiro que tinha uma carrocinha da Kibon na calçada deu-lhe de presente um Chicabon.

Quando ele foi deixado em casa ninguém ainda sabia do que tinha acontecido. Minha prima continuava na sua busca desesperada pelo pequeno primo perdido, já imaginando o que iria dizer ao chegar em casa sem ele e a reação não menos desesperada dos demais membros da família.

Até que visualizou minha avó que da calçada tentava nos encontrar para avisar que o fujão já estava em casa são e salvo. Encontramos ele ainda saboreando o Chicabon dado pelo sorveteiro, muito calmo e tranquilo.

Minha prima teve que tomar calmante para relaxar a tensão e reviveu a culpa e o estresse desse momento dramático em sessões de análise que fez anos mais tarde.

Como esse post é meio uma confissão de culpa, quero deixar registrado um recado para ela:
Maria Carmen, a culpada fui eu que o incentivou a ir andando sozinho e fiquei olhando até ele desaparecer sem te falar nada. Poderia te-lo impedido mas não fiz. Poderia ter te avisado, mas também não fiz. Não foi  por raiva, ciúme ou outro sentimento mesquinho. Foi curiosidade pura e simples. Vontade de observar o que ia acontecer, como todos iriam se comportar. Não foi à toa que optei pela Psicologia anos depois dessa história. O estudo do comportamento e das reações humanas sempre me interessaram.

 Perdoe-me por ter te usado de cobaia no meu primeiro ensaio! Espero que os anos de análise tenham te ajudado a superar esse trauma!

Ah, e já que é a hora da retratação, eu confesso que fiquei com inveja do Chicabon que ele ganhou do sorveteiro.

2 comentários:

picida ribeiro disse...

Aiii!! Que bom um texto seu!!!
Ufa!Emoções diversas:cheguei a ficar tensa com o sumiço,depois tranquila com o final da história
Ah!as mudanças... hoje o sorveteiro.ou outro alguem talvez tivesse feito um sequestro, exigido resgate,coisas do genero..
Ou estarei sendo injusta??

Márcia disse...

Já pensou se o seu irmão tivesse sido criado pelo sorveteiro bom samaritano? Como você acha que ele seria hoje?